Este é um pensamento que me ocorre quando percorro as calçadas de Fortaleza.
Desde sempre muito me agradou a proposta Armorial de Ariano Suassuna, de criar uma arte erudita brasileira a partir das manifestações populares de nosso povo e de nossa terra. É esta visão realmente sistêmica que me alegra. Distinguir as informações contidas no ambiente, recriá-las e formar uma estrutura coesa mas flexível, que forme, a partir de nossa essência, um modo de vida que nos valorize, nos forneça identidade e um contínuo fluxo de informações que viabilize um futuro digno.
É essa contextualização que acho imprescindível em nossa arte. Ela deve partir de uma maneira diferente de enxergar nossa cidade, nosso povo e nossa cultura. E essa maneira diferente deve render saída para qualquer manifestação artística, desde o design de móveis, talheres, utensílios de cozinha, às próprias comidas, roupas, músicas, arquitetura e vai além!
Imagine-se agora caminhando pelas calçadas de Fortaleza. A cada casa que você atravessa, o passeio se modifica. Uns têm plantinhas, outros cerâmicas, outros são apenas de concreto. Há culturalmente em nosso povo o costume de se apropriar da calçada, costume que provavelmente veio do hábito de sentar-se no final do dia com a família em cadeiras de balanço para um gostoso bate-papo. A calçada é uma continuação da casa que vai além muros. É uma sala de estar externa. Porque então vem um urbanista antipático e padroniza a paginação das calçadas tornando-as frias e impessoais? Tudo bem em se conseguir uma caminhabilidade e uma vegetação que forneça sombra para isso. Mas porquê seguir um padrão Champs-Elisée? Eis aqui a chave. Fortaleza, ao contrário de Paris não possui sua história contada como uma heróica Epopéia, mas sim pequenas crônicas e contos, muitos deles bastante jocosos! Fortaleza é um mosaico de pequenas histórias divertidas, interessantes, engraçadas, tristes. É como nossas calçadas: um grande mosaico de pequenas salas de estar, em que o povo – esse sim é o protagonista – é que põe a cadeira de balanço em roda e vai falar da vida alheia, olhar a rua, rir, fazer amizade...
Um comentário:
e como (!) balancam essas cadeiras e falam da vida alheia e olham a rua e "fazem amizade" e, claro, fazem rir no final! rsrsrs
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